Apelo em abaixo-assinado é direcionado à comunidade internacional e ao Itamaraty

Por: Mainary Nascimento
Docentes, pesquisadores e alunos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) estão reunindo assinaturas em uma petição online pela criação de corredores humanitários para refugiados do Afeganistão. O abaixo-assinado, aberto pela Cátedra Sérgio Vieira de Mello, está hospedado na plataforma Change.org, onde uma segunda mobilização ativa no Brasil e em mais cinco nações também apela pela abertura de rotas seguras para socorro aos afegãos.
O clamor mundial pela responsabilidade humanitária de líderes globais do Sul e do Norte, bem como da Organização das Nações Unidas (ONU), acontece como reação à tomada de controle do Afeganistão pelo grupo extremista e fundamentalista islâmico Talibã.

Para que o povo afegão não seja abandonado à própria sorte, organizações no mundo inteiro gritam por seu socorro. Além de pedir a criação de vistos humanitários e a abertura das fronteiras, as mobilizações apelam pela abertura dos corredores, que funcionam como uma zona desmilitarizada permitindo a passagem de suprimentos ou dos próprios refugiados.
A petição online lançada pela Cátedra da Unicamp engajou mais de 20 mil apoiadores em menos de duas semanas. A Cátedra é uma iniciativa da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), que visa promover, em parceria com centros universitários nacionais, a educação, pesquisa e a extensão acadêmica voltada à população em condição de refúgio.
Ana Carolina de Moura Delfim Maciel, presidente da Cátedra, aponta que o agravamento recente da crise no Afeganistão vai potencializar uma situação já insustentável no mundo: a quantidade de pessoas deslocadas à força de seus países. “A crise humanitária das últimas décadas vai deixar uma marca tenebrosa nesse longo capítulo da nossa história”, afirma. “Nosso abaixo-assinado visa facilitar o acolhimento de afegãos e afegãs, os dispensando da documentação normalmente exigidas nas fronteiras”, explica a pesquisadora.
A presidente destaca que, de acordo com o último relatório da ACNUR, atualmente há 82,4 milhões de pessoas deslocadas à força, o que equivale a quase toda a população da Alemanha. Do total de deslocados, apenas cerca de 26,4 milhões conseguem obter o estatuto de refugiado. “Quase metade deles é menor de idade, muitos dos quais desacompanhados dos pais ou de quaisquer familiares. Um milhão de crianças já nasceu como refugiado”, diz.
Ana Carolina, que é Doutora em História pela Unicamp, cita alguns nomes que estão por trás desses números e carregam histórias de uma tragédia em comum para países como o Afeganistão, Síria, Iraque, Eritreia e de nações da África Ocidental, do Centro e do Norte.
“O que une o menino sírio Aylan Kurdi, a menina salvadorenha Valéria Ramirez e o jovem Zaki Anwaki, promessa do futebol juvenil afegão, que despencou recentemente do trem de pouso de um avião da Força Aérea dos Estados Unidos? Esses cenários e seus personagens estão conectados pela necessidade de fuga”, ressalta a pesquisadora.
Uma das iniciativas, em parceria com a diretoria de Direitos Humanos, o gabinete do reitor e a diretoria de Relações Internacionais, é a elaboração de um edital para a implementação de bolsas de auxílio-permanência para professores, pesquisadores, estudantes e servidores universitários de proveniência afegã, na Unicamp.
“Empreendemos ações de acolhimento e permanência para alunos e alunas refugiados(as), pois temos a convicção de que garantir acesso ao Ensino Superior é possibilitar uma reinserção social no país de acolhida, através de uma qualificada formação acadêmica/profissional, propiciada também pela adoção de políticas de permanência pela universidade”, explica Ana Carolina, ressaltando, ainda, que a proposta da Cátedra é, sobretudo, possibilitar a integração e uma nova perspectiva de vida às pessoas acolhidas.
Confira o abaixo-assinado: https://change.org/CorredoresHumanitariosAfeganistao
O conflito
A crise está instalada há três semanas, desde que os Estados Unidos iniciaram a desocupação do Afeganistão depois de 20 anos. Nações europeias encerraram as operações de resgate e, nesta segunda-feira (30/8), o último soldado americano deixou a capital Cabul.
Também na segunda-feira, um corredor humanitário criado no Paquistão entrou em operação e permitiu que medicamentos enviados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) chegassem ao povo submetido ao Talibã. A expectativa, segundo noticiado pela emissora Al Jazeera, é que o Catar também consiga abrir rotas em breve no aeroporto de Cabul.

O Talibã já havia dominado o Afeganistão entre os anos 1996 e 2001, sendo expulso pela invasão americana. O grupo, que também atua no Paquistão, tenta impor a lei islâmica chamada “Sharia”, definindo condutas que restringem a liberdade dos muçulmanos.
Com o retorno dos extremistas ao Afeganistão, o então presidente Ashraf Ghani fugiu do país. Desde então, foram noticiados relatos de graves violações aos direitos humanos, como execuções sumárias e, especialmente, restrições a mulheres, meninas e jornalistas.
O posicionamento do Brasil
Diante da crise, o Brasil promoveu a retirada de dois cidadãos brasileiros e de suas famílias do Afeganistão. Um dos grupos foi levado para a Espanha e o outro ao Paquistão. Além desta medida, o Itamaraty se posicionou em sua página na internet dizendo que segue monitorando a situação dos cidadãos brasileiros que manifestaram interesse em permanecer no Afeganistão e que está atento aos pedidos de afegãos com visto de residência no Brasil.
Em nota divulgada no dia seguinte à ofensiva, o Governo brasileiro disse esperar o rápido engajamento das Nações Unidas para o estabelecimento de canais de diálogo, bem como que o Conselho de Segurança possa atuar para assegurar a paz na região. O Governo exortou, ainda, pelo acesso desimpedido de ajuda humanitária e respeito aos direitos humanos.
A equipe da Change.org entrou em contato com o Ministério das Relações Exteriores do Brasil para saber se o país irá tomar ou está estudando alguma medida para o acolhimento de refugiados afegãos, e como a nação irá atuar diante da situação de conflito. O Itamaraty também foi perguntado sobre o que fará diante da solicitação apresentada no abaixo-assinado e sobre a possível concessão de visto humanitário e facilitação de entrada e permanência de afegãos no Brasil. O órgão, entretanto, não se manifestou até o fechamento desta matéria.
Mobilização internacional
A outra campanha ativa na Change.org foi aberta pela ONG alemã Sea-Eye, que participa do resgate de migrantes em perigo no Mediterrâneo. A mobilização internacional já reúne quase 330 mil pessoas no Brasil, Alemanha, Espanha, Reino Unido, Índia e México.

Na petição, a Sea-Eye apela para que rotas seguras sejam criadas a fim de que as pessoas não precisem se arriscar fugindo por conta própria. A organização destaca que, sem esse socorro, o povo afegão terá que lutar para abrir caminhos em desertos e fugir em barcos improvisados, o que levará à morte muitas crianças e famílias pelo meio do caminho.
O grupo pretende chamar atenção à causa e reunir apoiadores em torno da mobilização para, com isso, sensibilizar os líderes mundiais a não evacuarem apenas seus próprios cidadãos e funcionários de suas embaixadas no país, mas também a pensarem e tomarem responsabilidade pelos afegãos que estão vivendo em perigo e aterrorizados pelo Talibã.
Matéria publicada na CartaCapital.

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